Do Dicionário de Citações

Dupla delícia.
O livro traz a vantagem de a gente poder estar só e ao mesmo tempo acompanhado.
Mário Quintana

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Entre Livros e Selfies (made man)


Textos sem Autores ? Edição sem Editores ?

No mundo atual da escrita e da publicação, a figura do editor tem se colocado frequentemente à prova. Autores que se autopublicam reproduzem um mito já bastante conhecido e que se acreditava desgastado do self made man. Há casos mais curiosos em que a edição de um livro pelo autor se apresenta com tanta simplicidade e imediatismo ao ponto de se acreditar que a diferença entre um livro e um selfie – outra palavra da moda – está no tempo do click. Espera-se que a escrita seja gerada em um intervalo relativamente mais lento.
Se a ideia de uma edição sem autor não soa tão estranha quanto a da edição sem editor, é possível, enfim, decretar a morte dos editores? Foi sempre assim?
Editores e autores possuem uma história tão longeva quanto os livros. Nem sempre caminharam juntos e, pensando bem, estiveram sempre em descompasso. Para situar um e outro apenas na era do impresso, ou seja, nos longos séculos que perfazem a segunda revolução do livro, cumpre informar que a história conheceu um “século do autor”. Primeiro na Inglaterra, após 1709, após a assinatura do Estatuto de Ana, o qual reconhecia o direito do copyright ao autor. Depois, na França das Luzes, quando os intelectuais reivindicaram, a exemplo do que ocorria na grande ilha, a posse e o direito por seus escritos. Para resumir a história, ou pelo menos fixá-la em apenas um aspecto, a saber, o da profissionalização dos agentes do livro, interessa observar que estava em jogo, naquele momento, o fim do mecenato. Portanto, a perspectiva de um autor viver de suas próprias penas.
Não demorava este movimento atingir o outro vértice da cadeia produtiva do livro, a saber, o editor. Na Renascença eram eles eruditos cujas funções se articulavam com a de sábios tipógrafos, a exemplo do helenista Aldo Manuzio (1450-1515). Outros impressores e livreiros demonstravam maior pendor para os negócios, o que não desmerecia a importância de suas funções.
Foi apenas no século 19, não por acaso “o século do editor”, que este passou a se confundir com a figura de um cavalheiro de indústria. Apresentavam-se mais ciosos pelo lucro do que pelas letras.
O que demonstra este breve histórico? A atual revolução por que passa o mundo editorial – e todo o aparato tecnológico que ela comporta – faz supor que a edição se tornou uma tarefa solitária e individual, tanto quanto se acreditava ser a escrita. Viveríamos hoje um revival do autor, o Deus-ex machina da era romântica? Autores podem – e devem – projetar luz sobre suas produções. Afinal, são tão numerosos os canais de distribuição, quanto os suportes de comunicação. Porém, entre a atividade do pensamento, da escrita, da revisão, da composição, da impressão e da venda de um livro, quantos caminhos e descaminhos percorrem um original até sua conversão em livro? O que nos leva a concluir que um livro de um homem só constitui uma realidade excepcional – por mais que se afirme o contrário.

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