Sant'Anna, lede por nós!
O Museu de Sant’Ana se apresenta como dessas pequenas joias incrustadas nas Minas Gerais. Ele ocupa o edifício da antiga cadeia, na cidade de Tiradentes, e faz jus ao que há de mais moderno em termos de museologia. A coleção foi reunida por Angela Gutierrez, que a doou ao Iphan e participou de perto da construção do museu.Por todas as partes da exposição a imagem de Sant’Ana se multiplica: Sant’Ana Mestra, a Mãe Ancestral, evoca “o poder gerador da terra com o da mulher”; em Santas Mães, vemos os cuidados de Ana com Maria e de ambas com o menino Jesus; em Sant’Ana Guia, imagem recorrente no Nordeste, Ana toma a filha pela mão e a conduz, com “amor e segurança, no rumo de seu destino de mãe do Salvador”; na Sacra Parentela unem-se em torno de Ana, matriz geradora, Maria, José, Jesus e Joaquim. Há ainda duas outras seções dedicadas aos mestres santeiros, nas quais se veem trabalhos de artistas eruditos e populares de diversas regiões do Brasil: do Nordeste açucareiro, das Minas do ouro e da São Paulo cafeeira. É bem verdade que em São Paulo a imagem de Sant’Ana fora trazida bem cedo pelos bandeirantes e primeiros moradores que a cultuaram como elemento de salvaguarda e proteção. As “paulistinhas”, como ficaram conhecidos esses santinhos de terracota, foram difundidas nos séculos XVII e XVIII pela capital planaltina, Itu, Guaratinguetá, Vale do Paraíba e Santana do Parnaíba. Há, enfim, um espaço reservado para a Fatura Negra, ou seja, para a imaginária afrodescendente, com as releituras e subversões características das manifestações do sincretismo observadas durante o Brasil escravocrata.
Imagem do Museu de Santa Ana, Tiradentes, Minas Gerais. Julho de 2015 |
Ocorre, todavia, que Sant’Ana conquistou a fé do povo. Como diz uma canção: “Reza, pois, pela mãe oprimida/Que tem filhos sem pão e sem lar”. Numa sociedade tão pungida, onde se mantém rígida a fronteira do Brasil que lê e o outro, resta dizer: “Sant’Ana, lede por nós”.
Artigo publicado em versão impressa na Revista Brasileiros, abril de 2016.
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