Do Dicionário de Citações

Dupla delícia.
O livro traz a vantagem de a gente poder estar só e ao mesmo tempo acompanhado.
Mário Quintana

terça-feira, 21 de setembro de 2021

Livros, Leituras, Bibliotecas: (re)relendo a arquitetura moderna brasileira (23/09/2021)



“Este é um livro sobre a paixão pelos livros”, declara Ricardo Rocha, logo no capítulo introdutório de seu Livros, Leituras e Bibliotecas – História da Arquitetura e da Construção Luso-Brasileira, publicado recentemente pela Edusp. 

Uma paixão que se expressa não apenas no apuro formal com que o autor conduz suas análises, mas também na descrição meticulosa dos livros e das marcas de leitura neles inscritos. 

Para aqueles que teimam em ver o livro como um mero suporte de leitura, de modo que as plataformas não lhe ficam a dever em nenhum aspecto – aliás, os velhos códices não raro excedem no peso e se apresentam em formatos pouco cômodos para a leitura  convém registrar uma advertência do autor, ao evocar uma edição de Fundamentos da Arquitetura Japonesa, de Bruno Taut: “nenhum [exemplar digital] ... conseguirá reproduzir as características do papel torinoko da capa, do tipo fusuma – com um padrão típico do norte do Japão – [...] ou do papel shigaramido texto – do Japão central” (p. 20). Embora esta não seja a questão principal do livro, impossível não se deixar seduzir por estas palavras iniciais, as quais nos permitem adentrar, pelo menos no que toca à defesa do livro impresso e à importância do objeto de análise do autor, a saber, as bibliotecas de arquitetos e as marcas de leituras inscritas em seus livros, na comunidade de sentidos de que trata a pesquisa. 

A trama é bastante complexa e nos faz lembrar que o estudo de Ricardo Rocha guarda um diálogo muito estreito com outras pesquisas brasileiras, voltadas para a reconstrução de bibliotecas desaparecidas, por meio do escrutínio de inventários post mortem. Se as marcas nos livros nos permitem recompor diferentes camadas de leituras, a ideia das bibliotecas como um universo de referências cruzadas, ou “palácios de destinos cruzados”, para citar o título do livro de Tania Bessone, tem muito a dizer sobre as comunidades de sentidos tecidas por nosso autor. Interessa observar que as marcas de proveniência de um exemplar permitem ao estudioso adentrar em bibliotecas dispersas em tempos e espaços distintos. 

É o que vemos no segundo capítulo, no momento em que o estudo de um certo exemplar de Guia do Engenheiro nas Construções das Pontes de Pedra (1844), aliás, adquirido pelo autor, em leilão, da biblioteca do engenheiro Zake Tacla, falecido em 2009, permite-lhe recuperar marcas de leituras que remontam há 150 anos desde o primeiro proprietário identificado no volume. A biblioteca de Takla, autor de O Livro da Arte de Construir, será analisada com mais vagar no capítulo 5, dedicado às bibliotecas dos engenheiros-arquitetos, de cujas coleções foram selecionados os livros e desvendadas as suas marcas de leituras. 

Sem dúvida, um estudo minucioso, bem escrito, que permite aos amantes do livro e da arquitetura, mas também aos curiosos de toda sorte, uma imersão singular nessa comunidade seletíssima de escritores, colecionadores e leitores arquitetos. 

Sobre o autor:

Ricardo Rocha é Arquiteto (1996), Mestre (2001) e Doutor em Arquitetura (2006), com Pós-doutorado na Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto (FAUP), Portugal (2008). É professor na UFSM desde 1998, no mestrado em Arquitetura e no mestrado em Patrimônio (Sta Maria) e na graduação (Cachoeira do Sul), sendo líder do grupo de pesquisa CrUPP Crescimento Urbano, Paisagem e Patrimônio (CNPq). É autor do livro História da Construção e da Arquitetura Luso-Brasileira: Leituras, livros e bibliotecas (EDUSP 2020).

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