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Catedral de Poitiers, Março de 2013 |
Do Dicionário de Citações
Dupla delícia.O livro traz a vantagem de a gente poder estar só e ao mesmo tempo acompanhado.Mário Quintana
segunda-feira, 17 de dezembro de 2012
terça-feira, 11 de dezembro de 2012
Sobre Livros - Diálogo com as Formas
Corpo e Alma do Livro
Sobre os mistérios que guarda a forma do livro, muito se escreveu. Pensemos na própria “lei de Gregory”, relativa a um aspecto curioso, senão, miraculoso do livro. A dobra das folhas de pergaminho fazia tocar, invariavelmente, os mesmos lados da pele, donde a fórmula: “carne contra carne”, “flor contra flor”, esta última designando o toque da face exterior.
Esses muitos mistérios nos remetem à própria origem da forma livro e sua longa duração na história ocidental. Sabe-se que o códice, ou livro formado a partir da dobra e junção das folhas apareceu na Roma Antiga, no primeiro século de nossa era. Demorou pelo menos quatro séculos para superar o rolo, ou volumen, formato que nos parece hoje um tanto desajeitado, pois obriga o leitor – à semelhança do que faz diante da tela de seu notebook – a “correr” o texto no sentido vertical, num prolongado desenrolar da página.
Dentre as muitas hipóteses formuladas em torno da vitória do códice sobre o rolo, duas sortes de argumentos saltam às vistas: aquele que vincula o novo formato às práticas cristãs de leitura do Evangelho; e, no extremo oposto, a disseminação de seu uso entre leitores de literatura, ou seja, o códice voltado para a fruição das letras. Fixemo-nos neste último caso, ainda que pareçam tênues os limites entre os usos sagrado e profano do livro por nossos personagens.
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Aquarela de Dante Rossetti (!828-1882) |
Como o corpo da pessoa amada, abrimos o livro e lhe acariciamos as páginas com emoção. É verdade que a exemplo dos “encontros” virtuais, existe a literatura sem o velho suporte de papel. E há quem a prefira. Mas é difícil acreditar que um beijo virtual seja melhor do que aquele que condenou Paolo e Francesca. As formas do amor são tantas quanto os modos de ler. Assim amor e livros guardam para si seus mistérios.
Escrito com a colaboração de Lincoln Secco e publicado em versão impressa na Revista Brasileiros - www.revistabrasileiros.com.br
terça-feira, 4 de dezembro de 2012
Sobre Livros - A maldição da letra de forma
A consciência de que a letra impressa rouba ao autor o controle sobre o escrito moveu teóricos e profissionais do livro por longos séculos
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Manuscrito de Petrarca http://www.citas-latinas.com.ar/2009/05/petrarca-y-el-humanismo.html |
A era inaugurada por Gutenberg (c.1398-1468) tornaria impraticável esta escolha. É bem verdade que apenas a nova ars impressoria pôde garantir à escrita, através da reprodução mecânica em série, regularidade e ampla difusão. Donde sua vitória sobre o manuscrito, processo que não se deu tranquilamente, tais foram as reservas que autores e leitores guardaram com relação à nova tecnologia. “Arte negra”, tomada pelo diabinho Tityvillus, que atentava revisores, compositores e impressores no processo de produção da letra impressa. Não falemos sobre as gralhas – erros tipográficos – que celebrizaram tantas edições princeps, as quais compõem todo um almanaque de curiosidades e de cobiças entre bibliófilos e bibliômanos.
Pensemos, antes, na figura do autor. Por fatalidade do destino ou fortuna, a maldição da letra impressa o fez refém da técnica, ao mesmo tempo que lhe rendeu honrarias e – quando muito afortunado – riquezas materiais.
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Dom Quixote |
Num golpe certeiro, o cavaleiro se dá conta de que estão emendando uma Segunda Parte do Engenhoso Fidalgo Dom Quixote de la Mancha, “composta por um tal habitante de Tordesilhas”. Não a verdadeira, mas uma edição espúria:
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Mario de Andrade (1893-1945) |
A consciência de que a letra impressa rouba ao autor o controle sobre o escrito moveu teóricos e profissionais do livro por longos séculos. Tem significados profundos, até a contemporaneidade. O debate em torno do direito autoral frente as novas tecnologias está na ordem do dia. No fundo, estamos às voltas com a velha questão do império da forma (ou do suporte) sobre o conteúdo. Mais vale pensar como Mario de Andrade (1893-1945), numa solução consoladora diante de um fato consumado. Escreve o autor à amiga Henriqueta Lisboa, em 10 de março de 1943: “É natural isso da gente cair num abatimento desiludido cada vez que publica um livro, eu sempre fico desolado quando enfim uma obra minha se converte a essa realidade brutal e castigadora de letra-de-forma”.
Artigo publicado em versão impressa e digital na Revista Brasileiros www.revistabrasileiros.com.br
domingo, 2 de dezembro de 2012
Sobre Livros - Efeméride
Paula Brito: Editor, Poeta & Artífice das letras
“O primeiro editor digno deste nome que houve entre nós.” (Machado de Assis)
Celebra-se em 2 de Dezembro do corrente o natalício do primeiro editor brasileiro.Paula Brito (1809-1861) despontou na cena pública carioca em tempos de lutas políticas, as quais culminaram na abdicação de d. Pedro I, em 7 de abril de 1831. Por essa época, o jovem tipógrafo – que aprendera o ofício na Imprensa Nacional – aperfeiçoava suas habilidades artísticas nas oficinas de Pierre-Seignot Plancher, fundador do Jornal do Commercio e proprietário de prestigiosa tipografia. Ali traduziu textos franceses, foi compositor e mestre-impressor.
Jovem, negro, de origem humilde, autodidata. Atuando em um cenário de instabilidade política e, vale lembrar, diante de um mercado de bens culturais dominado senão exclusivamente por franceses, mas por modelos europeus, Paula Brito rompeu as barreiras impostas aos de sua classe, vindo a constituir sua própria livraria e uma respeitável tipografia. Não obstante, o artífice que conhecera todas as etapas da produção gráfica, ao que mais tarde somaria o domínio sobre a litografia, logrou se tornar o primeiro livreiro-editor brasileiro de expressão no meio literário fluminense.

Imagens extraídas de
Paula Brito: Editor, Poeta, Artífice das Letras. Org. por Marisa M. Deaecto, Plinio Martins Filho e José De Paula Ramos Jr. São Paulo: Edusp; ComArte, 2010.
terça-feira, 27 de novembro de 2012
DiverCidades - Tîrgu Mureş e a Biblioteca Telekiana
Luzes em Tîrgu Mureş - Transilvania
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Bibliotheca Telekiana, detalhe da fachada - Fotografia da Autora |
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Fachada do Colégio, defronte a Biblioteca Telekiana |
O edifício que a abriga foi especialmente construído para este fim, em 1799. A instituição foi inaugurada em 1802, tornando-se, desse modo, a primeira biblioteca pública do país. É claro que o sentido de público tem nesse caso outras
nuanças, como bem as discutimos em nosso estudo sobre a abertura da primeira biblioteca pública na cidade de São Paulo, em 1825. Trata-se, antes, de instituição destinada a pessoas graduadas, estudiosos, acadêmicos, eruditos, noutros termos, um modelo tipicamente europeu, senão francês, pois em muitos aspectos ela se distancia de sua congênere anglo-saxã. Também não se confunde com os gabinetes de leitura, estes, sim, destinados ao grande público, com o predomínio, sabe-se, das obras beletristas.
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Fachada do edifício especialmente construído para a biblioteca |
Antes, porém, de nos deixarmos seduzir pelas raridades e outras coleções que mais tarde viriam enriquecer o acervo da Telekiana, detenhamo-nos um pouco mais nos títulos e autores que aproximavam este nobre intelectual às grandes questões do tempo. A Revolução Francesa, como deixa entrever seu catálogo, não lhe passou em brancas nuvens. Assim como a plêiade de autores que desenha, com traços fortes, a cartografia do Iluminismo imaginada por Franco Venturi. Ao lado da coleção de autores contemporâneos, a biblioteca constitui importante acervo de obras de arte, com gravuras de grandes artistas europeus, como, por exemplo, a edição em 29 volumes de Giambattista e Francesco Piranesi. A série “Biblioteca Clássica” conforma 1 400 autores grecos e latinos, reunidos em ordem cronológica, em três mil volumes. Um espaço especial foi reservado à biblioteca de sua esposa, Zsuzsanna Iktári Bethlen (1754-1797), cujo sobrenome ostenta a linhagem imponente do senhorio local.
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No subsolo, repousa intacta a coleção franciscana |
Foi nessa mesma época que a instituição recebeu coleções de outras escolas religiosas e a preciosa coleção franciscana do Mosteiro de Călugăreni. O fundo Teleki perfazia quarenta mil volumes e a coleção Bolyai, oitenta mil. Somem-se os mil e quinhentos volumes dos franciscanos e outros sete mil advindos dos colégios confessionais confiscados. Eis, em números, as primeiras coleções que deram corpo e alma a esta preciosa instituição, parecendo certo que outros muitos livros a ela se juntaram com o correr dos tempos, de tal sorte que o acervo atual possui cerca de duzentos mil volumes.
Versão completa do artigo em Livro n.2 - Revista do Núcleo de Estudos do Livro e da Edição (NELE)
www.atelieeditorial.com.br
segunda-feira, 26 de novembro de 2012
Sobre Livros - A Brasiliana Itaú
Nota sobre um utilíssimo Catálogo
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Pedro Corrêa do Lago, Brasiliana Itaú. Uma grande coleção dedicada ao Brasil. Rio de Janeiro: Capivara, 2010. Fotografia de Cinzia Araújo. |
O catálogo da Brasiliana Itaú nos oferece perto de 700 páginas e 2.500 imagens que são puro deleite!

Passemos em revista a estrutura da Brasiliana Itaú.Como esclarece o organizador, a obra matriz que orienta a coleção é a Brasiliana de Rubens Borba de Moraes. Ali estão o modelo e o conceito que servem de paradigma para o colecionador. Todavia, como bem advertira nosso bibliófilo, uma biblioteca, assim como qualquer outro tipo de coleção, resulta de uma série de fatores, os quais vão desde as condições sócio-econômicas que guiam a natureza e os limites (ou não) de um acervo, até aqueles outros fatores difíceis de mensurar, os quais poderíamos chamar simplesmente de “condições do meio” ou “espírito” do colecionador, na falta de termo mais preciso.
Destarte, se a coleção se ressente da falta de uma ou outra edição, se deixa de perfazer uma “Brasiliana Ideal”, estas são questões de somenos importância. Interssa relevar o quanto o colecionador se deixou conduzir para novos domínios, tocando, desse modo, o universo das Artes Visuais, da Tipografia, dos Livros-Objetos, dos Manuscritos (antigos e contemporâneos) e da Literatura.
Uma Brasiliana, portanto, que expandiu suas fronteiras para a arte, a técnica e a política dos séculos XVI ao século XX. Diante desse quadro vastíssimo, ela se orienta a partir das seguintes seções:
Obras de Arte
1.
Quadros a óleo
2.
Aquarelas e desenhos
3.
Objetos de arte
4.
Gravuras individuais
Livros e Impressos
1.
Brasiliana
Clássica
A.
Livros sobre o Brasil
B.
Álbuns iconográficos impressos na Europa
C.
Álbuns da fauna e da flora
D.
Livros ilustrados da América Latina
2.
Tipografia
no Brasil – A impressão de livros, periódicos e gravuras no século XIX
A.
Desenvolvimento da tipografia no Brasil
B.
Álbuns iconográficos impressos no Brasil
C.
Jornais e revistas do século XIX
3.
Literatura
Brasileira
A.
Literatura colonial setecentista
B.
Literatura do século XIX
C.
Literatura do século XX
4.
Livros
de artista
5.
Encadernação
no Brasil
6.
Legislação,
decretos e formação territorial
7.
Livros
portugueses
Documentos Manuscritos
1. Governantes do Brasil
2. Grandes figuras do Brasil
3. Manuscritos literários
4. Santos Dumont
5. Escravidão
Cartografia
Grande Atlas Blaeu
Cartografia brasileira
impressa
Economia e Finanças
Paulistana

À primeira vista essas divisões e sub-divisões parecem mais confundir o leitor do que situá-lo no mar de referencias que são os catálogos bibliográficos. No entanto, na medida em que avançamos e nos permitimos guiar pelo prazer da viagem, a navegação se torna fácil. Fica sempre aquela impressão de ter faltado algum livro na Brasiliana Clássica, até o momento em que nos deparamos com ele numa Paulistana ou, mesmo, na rica coleção iconográfica. É que, como explica o organizador, às vezes um livro se notabiliza por sua encadernação, ou por sua riqueza tipográfica. Noutras são as pranchas artisticamente ilustradas que se lhes conferem valor. Outras edições são simplesmente valiosas por seus autores, por seus tipógrafos, ou, enfim, por elementos de natureza diversa (dir-se-ia, o imponderável!): um erro tipográfico, um autógrafo, uma marca... va savoir!
quarta-feira, 21 de novembro de 2012
Sobre Livros - Notícia sobre a Brasiliana
... De Rubens Borba de Moraes
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Exemplar com anotações do Autor. Fotografia de Cinzia Araújo (Edusp) |
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Fotografia de Cinzia Araújo (Edusp) |
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Fotografia de Cinzia Araújo (Edusp) |
São mais de 10.000
títulos inventariados e 300 ilustrações de folhas de rosto de obras raras que
enriquecem os volumes. Sobre os critérios de seleção dos títulos, adverte o
bibliófilo em prefácio à segunda edição:
Mantive, no entanto, o mesmo objetivo: descrever e comentar livros raros que enfocassem vários aspectos do Brasil, antes, ou imediatamente após a Independência, em 1822. Incorporei os verbetes de minha Bibliografia Brasileira do Período Colonial (São Paulo, Instituto de Estudos Brasileiros, 1969) e encurtei os comentários. Nesta edição revista, os verbetes relativos aos livros dos séculos XVI, XVII e XVIII tiveram maior destaque do que aqueles das obras publicadas no século XIX, época em que a produção foi intensificada. Uma vez que os livros se tornaram mais acessíveis, as publicações desse último período deixaram de encaixar-se numa bibliografia sobre livros raros.
Note-se que para além do caráter elucidativo da produção impressa
sobre o Brasil, a obra diz muito sobre a produção ulterior de Rubens Borba de Moraes,
como bibliófilo, certo, mas, também, no campo da história do livro e da biblioteconomia.
O gosto pela pesquisa que não raro aproxima a figura do
bibliófilo à do historiador, tendência que se acentua dado o caráter ensaístico
de seus escritos, bem ao sabor de sua geração,
confirma-se em Livros e Bibliotecas no
Brasil Colonial. A epígrafe assinada por Lucien Fevbre – “L’historien n’est
pas celui qui sait. Il est celui qui cherche” (“O historiador não é aquele que
sabe. Ele é aquele que pesquisa.”) – não deixa dúvidas sobre o novo sentido que
se lhe conferem as andanças pelas bibliotecas e leilões do mundo: à coleção e
ao inventário, somam-se as reflexões sobre a natureza do livro e seus múltiplos significados para a formação da
cultura brasileira. Dir-se-ia, à luz do historiador francês, trata-se de tomar
o livro como um fermento das sociedades. Mais: o livro a serviço da História.
Uma vez mais, talvez de forma inconsciente, o espírito de
vanguarda aflora na pena do autor, ao se aperceber da invasão que o campo da
bibliografia operava na disciplina histórica. Em uma época em que a História do
Livro se afirma com vocação multidisciplinar, ou transdisciplinar,
Rubens Borba de Moraes não teria nada a justificar aos leitores sobre esta
possível transgressão. Donde o valor de suas reflexões e, uma vez mais, do
livro que acaba de ser editado pela Edusp em parceria com a Fapesp.
Versão completa do artigo em Livro n.1 - Revista do Núcleo de Estudos do Livro e da Edição (NELE)
www.ateliereditorial.com.br
Versão completa do artigo em Livro n.1 - Revista do Núcleo de Estudos do Livro e da Edição (NELE)
www.ateliereditorial.com.br
segunda-feira, 19 de novembro de 2012
DiverCidades - Souvenir do Simpósio
Sobre Livros - Brasiliana
Qual o primeiro livro impresso sobre o Brasil?
Pergunta Rubens Borba de Moraes.
A resposta foi publicada pelo autor em sua Bibliographia Brasiliana.
Trata-se de Mundus Nouus, de Amerigo
Vespucci (reprodução literal da folha de rosto).
Como escreve Rubens Borba de
Moraes a certa altura de sua explanação:
"Nenhum texto escrito por Vespúcio ou atribuído a ele foi impresso com tanta frequência quanto esta carta, dirigida a Pier Francesco de Medici, que descreve sua viagem à costa brasileira em 1501 e 1502."Assim Rubens Borba de Moraes discorre, em longo texto “recheado” de referências, sobre diversos aspectos da vida e obra de Vespúcio.
Da descrição a um só tempo detalhada e objetiva do livro em análise, até informações atinentes à produção, circulação e recepção em diferentes contextos históricos, nenhuma informação lhe escapa, o que não deixa dúvidas sobre a erudição do autor, outrossim, sobre o caráter original de sua Bibliograhia Brasiliana. A temática do primeiro livro sobre o Brasil seria retomada em Livros e Bibliotecas do Brasil Colonial, mas sem a riqueza de detalhes daquela que foi a primeira incursão no tema.
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São Paulo: Edusp; Fapesp, 2011, 2v. |
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